Olar,

chamam-me Rupi.

Estou aqui hoje para apresentar a minha humana.

Ela parece brava. E é mesmo.

É que ela me explicou que "brava", em italiano, tem um sentido mais "macio" - ela diz. Eu tbem sou brava - ela também diz.

O certo mesmo, o que eu acho, é que ela deveria vir aqui e se apresentar em primeira pessoa, como fazem as normais pessoas, mas então ela propôs ressignificarmos a palavra "normal"; chegamos à conclusão de que não somos normais.

Ah, já ia me esquecendo do mais importante: ela faz a professora (diz que os italianos têm essa expressão curiosa para se referir à sua função na sociedade).

O. Tempo. Todo.

Às vezes é cansativo... mas logo ela entra em aula ou vai preparar slides ou escrever crônicas ou demolhar o feijão ou estudar sobre educação ou se alongar ou tomar sol ou passar café... e aí a gente se livra um pouquinho dela e fica mais fácil conviver (os alunos dizem que gostam porque só aguentam 1h na semana, né? 🙄)

É isso, pessoal. Eu sou a Rupi, esta aí atrás é minha humana e este retrato é um #tbt.

Obrigada pela AUtenção 🐶

#queméela #professora #italiano #escrita #elementosdanarrativa #elementosdacomunicação #funçõesdalinguagem #interpretaçãodetexto #Enem #chegando #metalinguagem #sacou?

blog 

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15 fev 22 | PAINEL DE IDEIAS

Na coluna anterior (01/02), ao propor reflexão a respeito da importância de se adaptar à linguagem neutra no dia a dia, buscou-se compreendê-la como mais um reflexo daquilo que a língua sempre significou – tenhamos nós esta consciência ou não: uma ferramenta que, além de imprescindível a comunicação e oficialização de documentos, serve aos falantes como forma de validação das diversas formas de se reconhecer no mundo, especialmente em se tratando do gênero (masculino, feminino, não-binário) com o qual se identifique.


Mas é claro que nem tudo é tão simples e, a fim de perceber os caminhos tortuosos que o uso da linguagem neutra pode nos impelir a seguir indistintamente, sirvo-me da fala da professora do Departamento de Letras Vernáculas da Universidade Federal de Sergipe e editora-chefe da Revista da ABRALIN (Associação Brasileira de Linguística), Raquel Freitag: “linguagem neutra é uma coisa que não existe. Não existe neutralidade, em nada no mundo”.


Seu discurso pode ser sentido como uma punhalada cruel aos que se dedicam tanto a desmistificar o uso dessa linguagem cotidiana quanto a contextualizá-la frente aos desafios impostos por uma cultura que ainda conserva padrões normativos rígidos e excludentes. Entretanto, se estendermos sua linha de raciocínio ao âmbito político, por exemplo, vamos nos deparar com um impasse que vale o questionamento: que tipo de neutralidade é essa que estamos buscando?


É possível que, na ânsia por tratamentos justos a todos os seres, a linguagem neutra acabe por maquiar as desigualdades prementes das sociedades mundo afora. O mundo inteiro vem buscando, através da língua, estabelecer condições de acolhimento comunicativo e liberdade de expressão – e essa busca é legítima. As armadilhas começam a aparecer quando aplicamos a neutralidade linguística sem adaptação de critérios e sem levar em consideração os contextos de fala e escrita em que são tidos como ferramenta.


Exemplo dessa aplicação é a disseminação da linguagem neutra em textos científicos. Ao evitar usar palavras que diferenciam o gênero sexual por definição – como é o caso de substituir os termos “mulher”, “mãe” ou “gestante” pela expressão “pessoa gestante” em pesquisas relacionadas à saúde feminina –, corremos o sério risco de ver, no longo prazo, a presença da mulher na ciência perder o pouco de força que tem levado séculos para conquistar no ambiente acadêmico. Isso porque o fazer científico se vale, entre outras coisas, de palavras-chave para fortalecer sua notoriedade e ter estudos importantes relacionados a pesquisas de mesma essência.


Outra corda na qual tropeçamos ao ignorar a necessidade de atentar-se a cada contexto de uso da linguagem neutra é o fato que já foi repetido por mim à exaustão: a língua serve aos falantes – não o contrário – e, por essa razão, é reflexo da realidade (seja ela justa ou não). Dessa forma, desviar-se do fato de que não existe neutralidade na prática – até um voto nulo ou branco revela posicionamento – pode beneficiar ainda mais o sistema opressor no qual estamos inserides.


Embora a discussão não possa ser concluída em poucas linhas, finalizo esta breve proposta reflexiva concordando com Freitag: “eu advogo por uma a linguagem inclusiva de gênero, que está na pauta dos movimentos feministas há muito tempo”.


Como encontrar um equilíbrio entre os mais variados ambientes discursivos? Só o tempo, o discernimento e a coerência poderão nos dizer.

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10 fev 22 | CANTORAS BRASILEIRAS

Depois de trazer para vocês algumas cantoras populares italianas, chegou a vez da voz brasileira!


Foi muito difícil selecionar apenas seis. Ficaram de fora nomes como Teresa Cristina, Dona Ivone Lara, Sandra de Sá, Maria Rita... mas, com essa lista, também revelo um pouco do que toca repetidamente nas minhas listas do Spotify.

Beth Carvalho foi uma das maiores sambistas brasileiras, junto com Leci Brandão e Mart'nália, esta última filha do também famoso Martinho da Vila. Sou particularmente apaixonada por essa mulher e fiquei muito triste com sua morte em 2019.

Maria Bethânia, irmã de Caetano Veloso, é aquele tipo de voz que embebe de requintes o pão que o diabo amassou. Além de revelar a realidade baiana através de suas letras, também toca nossos corações com letras sobre amor.

Para as vozes de Alcione e Elis não tenho adjetivos passíveis de descrevê-las com a plenitude que elas merecem. Soberanas de uma potência inoxidável, essas mulheres fazem tremer os ossos de quem se submete ao deleite de suas interpretações.

Agora... é ÓBVIA que eu AMO todas elas, MASSSS... se você pudesse chutar qual delas é aquela que ouço desde pequena, com a qual mais me identifico e que daria TUDO para poder ir ao show, em quem você apostaria?!

Bônus: se você escreve, é imprescindível conhecer as canções interpretadas por essas mulheres, uma vez que descrevem, ora com acidez, ora com doçura, as dores e delícias de se ser brasileira/o/e.

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#culturabrasileira #músicabrasileira #samba #MPB #cantorasbrasileiras #bethcarvalho #alcione #mariabethânia #lecibrandão #elisregina #martnália #redação #escrita #interpretaçãodetexto #repertóriosociocultural #Enem #Fuvest #Vunesp #vestibular #ptbr #portuguêsbrasileiro #PLE #português #Brasil

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1º fev 2022 | PAINEL DE IDEIAS

Às cusparadas, há sempre alguém nas trincheiras de defesa ou acusação de qualquer movimento que ouse catarrar sobre as rebarbas do patriarcado em vez de lamber as botas do conservadorismo. Esse alguém pode ser ela, ele, elu, elx el@ ou o que você bem quiser dizer ou escrever.


O presidente da Argentina, Alberto Fernández, por exemplo, tem usado com fluência o termo “argentines” sem sombras de estremecimento. Até o polêmico Boris Johnson – cujo cerco sobre suas incursões festivas durante o caos pandêmico vem se fechando – já soltou na reunião do G7 que “o mundo precisa ser reconstruído a partir do princípio da neutralidade de gênero”. A Japan Airlines, por sua vez, representa o mundo corporativo nessa empreitada ao substituir o famigerado “ladies and gentlemen” por “welcome, everyone”. E a Letícia? Ela usou o termo “alguém” no início do texto, não reparou?


A linguagem neutra vem ganhando holofotes há anos e eu – reles professora de minha língua materna, sem mestrado nem doutorado, muito menos preocupação sobre como me julgam a partir dessa informação inútil – tenho evitado o assunto por genuína, límpida e honesta preguiça. Minha confortável inércia, entretanto, vem sendo perturbada de maneira crescente nos últimos meses, desde quando um importante veículo de comunicação pediu-me a palavra, às vésperas do Enem, a fim de saber minha sincera opinião sobre o assunto.


Dias depois de afirmar categoricamente que, embora seja prudente evitar o uso da linguagem neutra em provas oficiais – uma vez que não se teve tempo suficiente de legitimá-la através da oficialização documental –, é papel do professor, sim, abordar o assunto em sala de aula, explorando ferramentas didáticas e sensibilidade contextual para realizar a função mister de toda educadora e educador: abrir a caixa de retalhos do mundo e costurar, em conjunto com seus estudantes, as relações entre a realidade social e os cânones adotados há séculos, sem nunca se furtar ao questionamento de nenhuma imposição.


Parece-me tão simples e, com o perdão da arrogância, ridiculamente óbvio, que entrar nessa discussão de “pode” x “não pode” que o excelentíssimo “secretário da Cultura” tenta sufocar por meio do patético decreto de proibição do uso da linguagem neutra ratificado meses atrás corre risco de passar por inútil. Mas não é.


Já confessada minha prévia indisposição ao debate, encarno a personagem a mim conferida pela láurea em Letras como responsabilidade por tomar a palavra tal qual uma foice na vertigem de rasgar uma fenda à reflexão: o que nos sussurram ao pé do ouvido as entrelinhas deste embate que causa tanto incômodo à base conservadora mundo afora?


Ora, comunicar-se de forma neutra sempre foi natural e possível em todas as línguas. O próprio latim resguarda o artigo neutro em sua origem, perdido pela imposição do masculino como o pressuposto de maioria que, até hoje, pesa de pedantismo machista os discursos em todas as esferas de socialização.


É sabido, ainda, que a língua serve aos falantes de forma livre, provocativa e brilhantemente vulgar, enquanto a norma gramatical se presta à função de padronizar documentos e incluir seus falantes por meio de uma compreensão mútua das estruturas sintáticas bem como da semântica que compõe seus termos intrincados – o objetivo é incluir, não o contrário; percebe?


Fluímos nas línguas que usamos pela sua habilidade inerente de se modificar ante diversos contextos – e, vale lembrar, sempre à mercê da necessidade dos falantes – assim como água se reforma para ser acolhida em diferentes recipientes. Por isso, conservadores da língua escandalizados pela “ameaça” que enxergam na juventude eloquente a qual abre afluentes riquíssimos para desaguar a nossa preciosa língua portuguesa revelam-se pobres criaturas iludidas por trás de suas lentes carentes de ajuste ao estigmatismo político e miopia integrativa.


Vociferando imprudências contra o Supremo ou babando as márias de Frias, em poucos anos ficar-se-á ainda mais claro que todos os esforços para evitar que a linguagem neutra se instaure e se legitime nos documentos, nos livros, nas peças de teatro, nas escolas, na vida são apenas pólvora para explodir a realidade latente: nossa língua, sim, é neutra; e a saliva – do nosso povo – é quente.

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#línguaportuguesa #ptbr #linguagemneutra #linguística #inclusão #sociedade

24 jan 2022 | INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL



No vídeo ao lado, o jornalista, humorista e artista @brunnosarttori, conhecido pelas suas criações realizadas por meio de inteligência artificial, como as famosas deepfakes, questiona a ameaça que a manipulação dessas tecnologias pode representar na sociedade atual, especialmente em ano de eleições, num contexto em que o "vale-tudo" do marketing se mostra ainda mais agressivo na tentativa de ridicularizar adversários, difundir notícias falsas sobre eles ou mesmo se valer das técnicas em benefício próprio. 🧐

▶️ O título do vídeo postado no YouTube "O golpe tá aí. Cai quem quer?" acende a consciência para um questionamento latente neste contexto, valendo-se, ainda, do meme famoso que essa frase representa de forma afirmativa.

⚠️ Observe que a própria tia do Bruno acaba acreditando que está conversando com a ex-presidente Dilma Rousseff, quando, na verdade, está ouvindo um áudio manipulado por inteligência artificial.

➡️ É fato que a evolução nos é inescapável enquanto espécie e que a inteligência artificial traz consigo inúmeros benefícios para além do prazer proporcionado pelas críticas sociais e políticas bem humoradas feitas pelo Sartori.

❗️Mas até onde a insana "fábrica de fazer mitos" - e aqui não me restrinjo ao contexto político - pode lançar suas garras, manipulando inocência, crenças e ignorância de nós, usuários das redes sociais, em função de seus próprios interesses?

🔥 Tá aí um tema que pode ser bem recortado por vestibulares como #Enem, #Vunesp, #Fuvest e #Unicamp, em suas propostas de redação.

⚠️ Você já parou pra pensar nisso?

Conta nos comentários 🤓👇🏼

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@brunnosarttori
@dilmarousseff
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#inteligênciaartificial #deepfake #manipulaçãodaopinião #sociedade #reflexão #texto #escrita #redação #vestibular #pensamentocrítico #BORAESCREVER

20 jan 22 | ELZA SOARES

"Que vai de graça pro presídio
E para debaixo do plástico
Que vai de graça pro subemprego
E pros hospitais psiquiátricos

A carne mais barata do mercado é a carne negra

Que fez e faz história
Segurando esse país no braço
O cabra aqui não se sente revoltado

Porque o revólver já está engatilhado
E o vingador é lento
Mas muito bem intencionado

E esse país
Vai deixando todo mundo preto
E o cabelo esticado

Mas mesmo assim

Ainda guardo o direito
De algum antepassado da cor

Brigar sutilmente por respeito
Brigar bravamente por respeito
Brigar por justiça e por respeito
De algum antepassado da cor

Brigar, brigar, brigar

A carne mais barata do mercado é a carne negra"

🔺️ A dica de hoje é homenagear o estrondo em forma de mulher que foi Elza Soares, cantora brasileira icônica que faleceu naturalmente em sua casa hoje (20/1/22), aos 91 anos.

🔺️ Deixa legado, deixa história e deixa um arquivo precioso de músicas amargamente reais, as quais dão visibilidade ao sofrimento negro, às condições da mulher, além de criticarem, sem papas na língua, a sociedade patriarcal brasileira.

⚠️ Sem dúvida alguma, Elza nos oferece um repertório sociocultural infindável sobre o qual refletirmos, interpretarmos e aplicarmos em nossos textos.
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@elzasoaresoficial
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#ElzaSoares #acarne #músicabrasileira #cantorabrasileira #ícone #descanseempaz #RIP #ouçaElzaSoares #redação #repertóriocultural #cultura #sociedade #Brasil

18 jan 21 | PAINEL DE IDEIAS

“O meu olhar não leva jeito de chorar / Quando vê o teu sorriso derramar / Esse riso cristalino de alegria / Como o beijo que a praia deu no mar”.


Tal qual Dominguinhos canta nos primeiros versos de “Riso cristalino”, a maioria das abordagens a respeito do riso o trata como expressão de contentamento, associado a situações alegres e emoções acolhedoras. No entanto, como tudo que observado em profundidade ganha complexidade, a Fuvest deste ano resolveu mergulhar nas diferentes faces que o riso pode representar na sociedade moderna.


Passado o estranhamento, a interpretação dos textos de apoio nos permite recordar outros contextos em que o riso se faz presente – quem nunca riu de nervoso ante uma situação embaraçosa que atire a primeira gargalhada. O viés mais instigante, entretanto, é a percepção do riso como ato político, especialmente quando vive-se o caos global de um mundo arrebatado por uma pandemia temperada pelo luto, pela miséria, pela mediocridade humana.


Quem lê a frase temática de forma inocente, porém, perde de vista a íntima conexão que o assunto estabelece com a realidade atual: a reflexão lança luz à importância da comédia enquanto adjuvante na crítica social e, consequentemente, política. Basta nos lembrarmos do misto de alívio com desespero provocado por esquetes de artistas como Marcelo Adnet ou produtoras de conteúdo como o canal Porta dos Fundos, ou ainda o noticiário Greg News, os quais manipulam com requintes de genialidade catástrofes titânicas, informações maquiadas pelo (des)governo e boçalidades excrementadas pela família “B” – de você sabe o quê – a fim de proporcionar a tão necessária ilusão de vingança momentânea sem a qual é quase impossível se levantar da cama para viver mais um dia.


Nesse contexto, é interessante perceber a função do ridículo nas vivências coletivas, já que elevar ao ridículo figuras políticas oferece à população vazão à agressividade e até mesmo frustração provocadas por suas decisões públicas. Por outro lado, fazer-se digno de riso pode aproximar pessoas, atenuar conflitos e nos ajudar a lidar com as nossas próprias imperfeições – aceitando-as no outro com mais facilidade.


É impossível, ainda, pensar o riso sem se lembrar de figuras icônicas como Orlando Drumond (seu Peru, da Escolinha do Professor Raimundo), Paulo José, Sérgio Mamberti (Doutor Victor, do Castelo Rá-tim-bum), Luís Gustavo – para ficarmos apenas nas vidas perdidas em 2021 – que o usaram brilhantemente como ferramenta não só de trabalho, mas de estudo e de luta, sem falar em Paulo Gustavo, que abriu uma fenda em nossos corações ao ser vitimado pela Covid – em consequência da incompetência e do maucaratismo do presidente que tolheu do Brasil o direito à vacina a tempo de salvar tantas vidas – nos deixando a mensagem tão cristalina quanto o riso da amada de Dominguinhos: “rir é um ato de resistência”.


Um tema, enfim, atual e provocativo – ao mesmo tempo que perene – como era de se esperar da Fuvest. As candidatas e candidatos que dominam as técnicas de redação e exercitam a leitura para além das páginas dos livros e revistas, forjadas por um espírito questionador, capaz de subverter as banalidades do cotidiano, administrando a ansiedade natural diante de uma prova como esta, certamente se saíram bem.

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#fuvest #fuvest2022 #redação #texto #escrita #riso #resistência

10 jan 22 | A FILHA PERDIDA

Filmes perturbadores para dias chuvosos?


Temos!


Lançado na Netflix no último dia de 2021, "A filha perdida" é um longa baseado no livro homônimo da misteriosa autora italiana Elena Ferrante.


Adaptado para as telas pela atriz Maggie Gyllenhaal (dá um gúgou que você vai lembrar quem é!), o longa acompanha a viagem de férias da professora universitária Leda (Olivia Colman), que vê seu sossego perturbado por uma família tão rumorosa quanto perigosa.


Entre os conflitos que presencia e nos quais se envolve, a protagonista vive epifanias que a levam às lembranças da infância das duas filhas, revelando - através da acidez penetrante de Ferrante - as nuances mais íntimas de uma maternidade muito distante da que nos é comercializada e, por isso mesmo, amargamente real.


E como qualquer construção sintática é insuficiente para definir a intensidade que essas mulheres - autora, atrizes, diretora - trazem para o nosso degustar (especialmente se a espectadora for mulher), sugiro a leitura da crítica escrita pelo Caio Coletti no portal Omelete, que me surpreendeu pela sensibilidade de perceber o que, rara e infelizmente, poucos homens percebem:


"Há um refrão comum que parece surgir na crítica de cinema sempre que um filme como A Filha Perdida é lançado, e especialmente quando jornalistas do gênero masculino falam deles. Como tática defensiva, talvez, esses críticos costumam dizer que as obras em questão encarnam algo de “fugidio”, ou “elusivo”, sobre a condição feminina, às vezes até transformando em elogio o fato de serem incapazes, por serem homens, de entenderem esses filmes por completo.


(...) A Filha Perdida é uma aula de como usar o cinema como ferramenta de empatia. Não que ele se retorça e se “suavize” para ser entendido (...), mas ele não obscurece nada, não trata nada como mistério. Está tudo na tela, à plena luz, mais evidente impossível. Basta querer enxergar."


Quem já viu, o que achou?


#dicamarota #ElenaFerrante #AFilhaPerdida #Omelete #filme

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4 jan 21 | PAINEL DE IDEIAS

Por isso, é comum que, ao longo dos anos, nos deparemos com expressões que, desgarradas de sua origem, já não são compreendidas pelas gerações mais recentes, assim como novas terminologias são criadas para nomear objetos, movimentos, costumes, pratos que até então não tinham definição através da palavra. É o caso, por exemplo, dos termos “pão”, usado para se referir não só à obra-prima do padeiro mas também a um homem bonito, e “fumódromo”, que se vale do processo de formação de palavras por sufixação para indicar “o lugar onde se fuma” (tal qual autódromo, sambódromo) – espaço que nem existia há pouco mais de dez anos: o léxico foi criado pela necessidade de nomear o novo.


Da mesma forma, termos que hoje usamos com uma determinada finalidade podem ter seu sentido esvaziado, subvertido e até mesmo deturpado. O que dizer do ranço coletivo que cultivamos pela palavra “empatia”? Um termo tão belo, tão pleno de significado, mas que se viu tão desgastado pelo uso aleatório que passamos a fazer dele que não surte mais efeito nenhum sobre nossas consciências.


O mesmo acontece agora com a palavra “narrativa”.


E o que se sabe sobre o que é, de fato, uma?


O termo vem do latim “narrare” (narrar, contar, relatar), literalmente “tornar conhecido”, uma vez que sua raiz “gnarus” significa “o que sabe”.


A narrativa, enfim, é toda história composta por seus elementos fundamentais: foco narrativo, enredo, personagens, espaço e tempo. E por mais que o uso atual da palavra para um fim parecido com o da tal ‘empatia’, o ser humano foi, é e sempre será naturalmente ávido por narrativas (embora tenha de se esforçar muito para ser verdadeiramente empático).


Nosso interesse pelas histórias é nato. Chegamos ao mundo confusos, traumatizados pelo parto, clamando sobrevivência. Antes mesmo de aprendermos a traduzir o código que sistematiza nossa língua, reconhecemos os elementos das narrativas que nos são contadas e buscamos desesperadamente por identificação nas personagens de livros, contos de fadas, filmes, séries e até mesmo da nossa vida: quem nunca pensou em ser professor, jornalista, engenheira, médica inspirado pela história de um desses profissionais?


É claro que não demorou até que a publicidade sacasse a ferramenta poderosíssima que é uma história bem contada. E, para contar uma boa história, inúmeros especialistas se debruçam em pesquisas sobre o comportamento e a mente humanas. Inevitavelmente, o marketing transforma esses estudos em uma arte que apele para nossos instintos mais básicos, administrando os elementos da narrativa a depender de seu objetivo: divulgar um evento, demonstrar um produto, vender um político.


A narrativa per se faz parte da concepção social do homem e, por essa razão, é inescapável; a palavra, por sua vez, tem sido deturpada. Tudo é narrativa. E sendo “tudo narrativa”, espectadores se perdem entre a defesa das histórias que julgam verdadeiras e o ataque àquelas supostamente falsas sem perceber a intimidade profunda com a qual se envolvem com personagens heroicos ou vilanizados, enredos que confundem o dever do Estado com religião, espaços e tempos recortados, editados e mixados entre fatos e opiniões e um narrador cuja sanha maior é parecer onisciente e ser onipotente a fim de disfarçar a sua total inapetência em estar onipresente quando a núcleo pobre dessa novela realmente precisa de um protagonista.

30 dez 21 | RETROSPECTIVA 2021

Olhar para trás é sempre um exercício potencialmente construtivo: damos vida aos recortes de lembranças com que costuramos nossa memória e, sob uma perspectiva relativamente distante do evento, temos a oportunidade de enxergar o contexto com mais clareza, reviver emoções (das confortáveis às perturbadoras) e recriar a linha do tempo a fim de atribuir sentido ao enredo que nos trouxe até aqui, agora.


Entretanto, apesar de me deliciar com as retrospectivas audiovisuais, sou um tipo esquisito de pessoa que prefere editar palavras a imagens; talvez porque, dessa forma, eu seja capaz de manipular os elementos da narrativa em meu favor.


E...


quem nunca?


Por essa razão, antes de dividir meu retrospecto com você, te convido a "investigar o que passou" através de um exercício de escrita.


Você pode usar o bloco de notas do seu computador - como eu estou fazendo - ou do seu celular.


Prefere o Word?

Manda bala!


Só tem o LibreOffice?

Vai com ele mesmo!


Conhece outro app bacana para quem curte escrever?

Conta pra gente, ora.


Quer dar um respiro das telas e guardar sua retrospectiva só para si?

Chega na clássica dupla papel & Biczeira que é sucesso!


Agora, se você estiver precisando de uma inspiração para começar esse processo que parece tão simples, mas, ao mesmo tempo, assustador, se liga nesta possibilidade aqui:


JANEIRO

Vivíamos, minha família e eu, em um apartamento de 55m² na Vila Guarani, na Zona Sul de São Paulo. Uma certa inquietação nos fazia calcular quanto tempo tínhamos de contrato na ilusão de podermos nos mudar para um apartamento mais amplo ou, pelo menos, com mais um quarto para ambos termos os nossos escritórios. Ao mesmo tempo, eu assumia as aulas de Redação em um colégio do Bom Retiro, tendo como coordenadora uma amiga da faculdade extremamente competente.


FEVEREIRO

Ainda zonzos pela pancada do reajuste no aluguel, concluímos que não tínhamos c* para morar em outro lugar de SP e demos início a um plano que a gente nem sabia que já estava arquitetado: mudar de cidade. Eu também começava a perceber a loucura que era viajar pelos túneis do metrô em plena pandemia sem saber quando a vacina viria.

MARÇO

Então, entre tropeços, ao mesmo tempo entusiasmados e amedrontados pela mudança, chegamos de mala e cuia à Pérola do Atlântico em uma sexta-feira. Só então, contamos aos nossos pais. No sábado anterior à mudança, meu aniversário, eu saía de uma colonoscopia. Na segunda seguinte, tinha uma entrevista de emprego.


ABRIL

Depois de milhares de anos aguardando resposta, fui formalmente contratada no dia 19, exatamente um mês após chegar em Guarujá. Muita ansiedade, muita euforia e um pouco de alívio. Fui a uma aula de surf escondida – senti por duas semanas as dores musculares dessa traição.


MAIO

A cada dia, sentia que havíamos tomado a decisão certa de vir para cá. Mas um certo vento da insegurança vez ou outra lambia meus ouvidos sussurrando obscenidades sobre o oportunismo da classe média paulista que desbarrancava em peso para as bordas do continente – quem sabe na esperança de fugir desse governo desprezível ou da culpa por tê-lo eleito por tabela quando decidiu votar no branco, no nulo ou no sapatênis.


JUNHO

Na véspera da minha primeira aula ao vivo no trabalho novo, tive insônia e resolvi digitar minhas ideias de um possível projeto no bloco de notas do celular. Naquela semana, editei o rascunho, deixando de forma apresentável para os demais professores. A proposta era ousada: fazer uma série de aulas abertas relacionando a redação com elementos da culinária, ninguém iria topar. E não é que a galera abraçou a ideia?

Concomitantemente, as primeiras luzes de Natal começavam a se acender, mas não eram pisca-piscas: eram as vacinas! A prefeitura da cidade começava a divulgar o calendário. Será que mês que vem… vem?


JULHO

Por algum motivo curioso – negacionismo, população flutuante, os dois? – a vacinação sempre esteve adiantada aqui. Nos imunizamos na primeira quinzena do mês. O alívio foi tão grande que menstruei, depois de meses em uma amenorreia inquietante e inédita.

A série que criamos foi um sucesso e rendeu outro projeto para o mês de agosto, dessa vez de Geografia.


AGOSTO

O mês interminável foi de planejar nossa ida à terrinha: a maravilhosa Rio Preto e seu clima infernal. No meio tempo, matei um pouco as saudades das aulas de yoga na pracinha do Vivendas oferecendo uma prática no Instituto Gremar, onde, “coincidentemente”, trabalha uma amiga muito querida e é pertinho de casa. Era dia 28 quando chegamos a Catanduva.


SETEMBRO

Passei a primeira semana do mês infernizando a vida da minha mãe: dei fim em tudo o que estava vencido da geladeira e fiquei dando palpite de vizinha enxerida todos os dias. É preciso muito amor materno para me suportar; obrigada, mãe.

Pela primeira vez em um ano e meio, nos encontramos com amigos queridos. Foi um presente estar com vocês!


OUTUBRO

Preparativos para temporada Turbo Enem comendo soltos enquanto eu tentava não enlouquecer com minhas outras demandas profissionais. Na última semana, abrimos a temporada.


NOVEMBRO

Trabalhei em todos os feriados – do que não me queixo, afinal ganhamos duas folgas para cada feriado ou domingo trabalhados –, fui a São Paulo, conheci pessoalmente meus colegas das humanidades e confabulamos ideias mirabolantes sobre o que e como e onde e com quem fazer os melhores conteúdos para nossas alunas e alunos no ano que vem.


DEZEMBRO

Clima de férias, alunos de italiano e redação começam a dar suas pausas e, agora sim: pisca-piscas! Recebi minha mãe – o que me rendeu uma ótima oportunidade de desfazer o carão que passei da última vez em que fui sua hóspede. Comprei cartolinas para fazer os cartões de Natal para meus alunos de italiano, mas fiquei com preguiça e mudei estrategicamente para cartões de Epifania (6 de janeiro). Encomendei um planner personalizado, terminei livros começados, comprei mais livros (novos e usados), fui a São Paulo, conheci outros colegas de trabalho, fiz uma focaccia bem bonita para o Natal e, enquanto escrevo, com o zíper do shorts aberto e a blusa dobrada em si mesma para a pança receber o ventinho fresco do ventilador, tento bolar um plano com mozão para fugirmos dos turistas que brotam como ratazanas brancas vindas de todas as direções, em pequenos grupos, cheirando a Sundown fator 70, como em marcha de procissão, nessa época fatídica do ano para cidades turísticas como a nossa.


E PARA O ANO QUE VEM?

Continuar aqui? Voltar para São Paulo? Outra cidade?

Outro país?

Nova rotina? Reciclagem de hábitos?

Promessas?

A única coisa de que sei é que o ENSINO, a ESCRITA e o YOGA estarão presentes nessa jornada.


Como?

Não tenho a menor ideia.


E que venha 2022!

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#diário #escrita #proposta #retrospecto #retrospectiva2021 #exercício #exercíciodeescrita #escrever

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23 dez 21 | DEXTER - NEW BLOOD



Será?

O Natal se aproxima e muitas aparências ficam em evidência quando as pessoas se juntam pra "fazer um social", não é mesmo?

Se a frase do protagonista da série Dexter (2006) faz sentido e, se além disso, você se amarra em exercitar o raciocínio analítico e refletir sobre a essência humana em seu convívio social, essa narrativa vai te conquistar.

Inspirado nos livros do escritor Jeff Lindsay (a começar por "Dexter, a mão esquerda de Deus"), o enredo é uma costura das memórias do protagonista, que é resgatado, ainda bebê, de uma cena horripilante pelo seu pai adotivo, o policial Harry.

Apesar do aparente final feliz, Harry percebe, ainda na infância, as macabras tendências do filho e toma uma difícil decisão - essa é a parte misteriosa que te convence a começar a assistir ou a ler o livro agora mesmo! - que molda todo o futuro de Dexter.

Quem me acompanha nos stories já está sabendo da minha relação com uma personagem quase tão importante quanto o protagonista, a irmã adotiva de Dexter, Debra Morgan.

E por que resolvi ressuscitar essas lembranças agora?

Porque, depois de sete anos do "grand finale", a Paramount lançou a continuação intitulada "Dexter - New Blood", que já está me surpreendendo por conseguir manter a qualidade da narrativa ao mesmo tempo em que aprofunda a complexidade das personagens.

Simplesmente incrível!

E aí, já conhecia essa série?

Ficou curiosa para saber mais?

Tem alguma dica de obra (quadrinhos, desenho animado, filme, música...) no estilo suspense, capaz de colocar nossa caixola para pensar?

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#dicamarota #pensamentocrítico #raciocínioanalítico #reflexão #sociedade #humanidade #psicose #traumadeinfância #livro #série #Dexter #paramount

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21 dez 21 | PAINEL DE IDEIAS

Sentia-se em casa.


Analisou rapidamente o recinto recheado por uma espécie bem conhecida – a de gente branca, herdeira e bem paga; satisfeita por gozar dos pequenos prazeres lambuzados a azeite extravirgem e vino rosso al bicchiere – até perceber que, à sua esquerda, havia escape para um jardim ao ar livre: “ma dai!”, balbuciou antes de se acomodar.


Folheou curiosa e lentamente o cardápio sem a menor intenção de pedir algo que não fosse a sua tradizionale margherita. Gostava de ler, estava sempre faminta; sua gana insaciável se estendia aos letreiros, revistas, manchetes, cruzadinhas penduradas nas bancas de jornal, menus ítalo-tropicais… Apertava seus olhos esverdeados, desenhados por vasos vermelhos denunciantes de suas noites de insônia, de modo a invadir a sutileza estéril que contorna a mediocridade daquelas pessoas, exemplares tão prototípicos da animalidade humana a qual se reveste de pompa a fim de maquiar seus instintos miseráveis; e apesar da intensidade com que o fazia, raramente era notada.


Aprumou o olhar para chamar o garçom e já se divertia com as caricaturas medievais que a clientela se orgulhava em representar no teatro da vida média quando o salão pelo qual passara minutos antes começava a se encher de burbúrios. O clima pesou. Os poros de Elena se fecharam repentinamente, como quando sua mãe contava do glorioso dia em que enfrentou a fila para cuspir o chão da praça que exibia o corpo dependurado de Benito Mussolini. Timidamente – afinal de contas, a euforia é caráter da plebe – os protetores dos bons costumes clamavam “mito”, acenando inocentemente com a mão esquerda enquanto a direita ajeitava dentro da cueca o minúsculo membro, levemente rijo ante a presença de seu ilustríssimo presidente.


Elena observava tudo placidamente. Não era sua primeira vez. Ainda na Itália, lá pelos seus vinte e poucos anos, vivia entre mafiosos cuja descendência fascista ou liberal não se podia facilmente reconhecer. Estava habituada à sensação nauseante a contorcer-lhe as vísceras enquanto homens – sempre em maioria – sorriam aqueles dentes amarelados pelo inevitável chorume autocultivado. Sentia-se em casa.


A pizzeria parou para ver, filmar, lamber e aplaudir a brutta figura. Inevitável – era seu ninho, disso sabia de antemão. Mas ainda que a “cidade alta” como um todo o louvasse, ninguém no restaurante soube que, horas antes, havia sido vaiado na praia. Elena riu sozinha da cena que criara ao imaginar o evento: o branco sendo escorraçado pelos índios que lhe empalavam com os cabos de seus próprios espelhos.


Aproveitando a agitação do ambiente, ajeitou as tetas suavemente em seu vestido de linho e levantou-se para sair. Encostava suavemente a cadeira à mesa quando uma atenciosa garçonete a interceptou:


- Não vai fazer seu pedido, senhora?


Sorrindo empaticamente, Elena encaixou a máscara de volta ao rosto e respondeu com seu português brasileiro ainda muito respingado pelo sotaque europeu:


- Obrigada, mas mio apetite mudou, signorina.


Parou em um quiosque a alguns metros dali. Pediu uma cerveja e meia porção de lula à dorê.


Oggi a mia noite non acaba em pizza”.


Já não se sentia em casa; sentia-se bem.

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Texto publicado originalmente na versão impressa do Diário da Região.

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20 dez 21 | poesia para uma mãe




desde que me tiraram de ti
naquela manhã de março
nenhum lugar, nenhum espaço
é suficiente pro teu abraço.

até minha casa eu preparo
com café singelo
cravos amarelos
e pão fermentado...

não obstante tente
nenhuma sala é suficiente
nenhuma cozinha é tão acogliente
nem nossa língua é eficiente
para descrever mormente
a amplitude do amor cultivado
em teu ventre.

dois lares,
uma fotografia.
somos flores, raízes, daninhas;
espinhos de uma mesma espinha,
pomares
coléricos de alegria.

mamma ❤
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#mamma #poesia #maternidade #crônica #mãeefilha #amor

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17 dez 21 | CANTORAS ITALIANAS

Vamos de variedades hoje?

VAMOS!

Se, assim como eu, você é uma pessoa aberta a experimentar coisas novas e não perde uma oportunidade de valorizar o trabalho de mulheres mundo afora, essa lista vai te pegar de jeito!

#1 

Apesar de tê-la conhecido através do single VALANGHE (avalanche) e de a música mais famosa ser ESPLODIGODI (exploda e aproveite), a minha preferida é VIVIDI DUBBI, na qual a cantora questiona estereótipos da vida perfeita: "nessuno in fondo trova dentro di sé una risposta" (ninguém, no fundo, encontra uma resposta dentro de si). Simplesmente viciante!

#2

Artista ítalo-palestina, Laila explodiu nas plataformas de streaming italianas com músicas indie-pop com "sapore estivo" (sabor de verão), de letras transparentes e diretas e com um tom de voz impacientemente sedutor. Minha música preferida dela é "Soffice".

#3

Descobri essa diva do pop moderno italiano por indicação das minhas então alunas @anaoliviam e @amandafreiberger e me apaixonei instantaneamente. Com uma pegada meio Anitta, meio Gaga, ela desperta das profundezas qualquer espírito borocochô.

#4

O talento italiano recém-descoberto com o qual eu mais me identifico da lista, ela se mostra de cara limpa, transita de ritmos mais empolgantes aos mais reflexivos e rasga nossa imaginação com sua voz levemente rouca. Comece pela música "qualcosa" e deixe-se levar pelas sugestões do Spotify para sentir se ela faz seu estilo.

#5

E para quebrar o clima anos 2000 da nossa lista, conheçamos a inesquecível, poderosa, inquietante e eterna Carrà! Uma das maiores divas italianas de todos os tempos, Carrà rompeu com os padrões, cantou a liberdade sexual feminina e teve até música censurada pelo Vaticano. Pensa! Infelizmente, ela faleceu este ano (2021) aos 72, deixando fãs surpresos visto que não se sabia que ela enfrentava uma doença e estava super ativa na mídia, sendo, inclusive, uma das juradas do The Voice Italia. Músicas que você não pode deixar de ouvir: TUCA, TUCA e TANTI AUGURI.

Agora você não tem desculpa para não curtir o fim de semana!

Dá o play e depois volta aqui pra me contar qual curtiu mais!

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#dicamarota #musicaitaliana #donne #cantanteitaliane

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7 dez 21 | PAINEL DE IDEIAS

A palavra que dá origem aos derivados de “fêmea” (feminino, feminilidade, feminismo, femismo), cuja etimologia latina sugerida pelo escritor alemão Thomas Mann "fides minus" significaria "aquela que não é digna de fé", resguarda vestígios do radical “fe-”, associado à ideia de fecundidade. Tanto uma sugestão quanto a outra, entretanto, acabam por distorcidas ou insuficientes, vez que a fecundidade supostamente feminina – representada também pela natureza – prescinde de um ambiente favorável para se revelar.


Tendo sido nós e tudo o que nos concerne, descreve, sustenta o feminino subjugado por séculos, pode ser desesperador o alcance do momento em que nos percebemos carregando no útero – termômetro insubstituível de nossas saúdes, sendo ele capaz de fabricar novos seres ou não – o inefável legado de se ser mulher. É aterrorizante o som metálico que reluz dentro de nossas cabeças quando a ficha do absurdo cai. Algumas, resignam-se; outras, revoltamo-nos.


Para estas, há o tempo de palpar a densidade de suas nuances no escuro das entrelinhas do que nunca nos contaram – e permanecem em segredo – buscando qualquer rastro de autoria ancestral. É confuso, intenso, dolorido, perturbador e, sobretudo, infindável: o caminho da mulher que se busca e se encontra em pedaços, cuja narrativa, diluída em fragmentos, vai se recosturando na memória tão logo as partes do quebra-cabeças se tornam minimamente discerníveis não começa, não acaba; só tem meios, não vê fim.


Humanos que somos, ‘feminas’ ou ‘masculus’ em nosso próprio reconhecimento, enfrentamos o desafio de viver o intervalo entre partir das entranhas e partir às estranhas que nos aguardam ante a morte.


Eu sei.

Se sabe.


Mas cá entre nós, entre fêmeas, é preciso força-tarefa de nossos mil lábios tesos pelo cansaço da viagem, de nossos habilidosos dedos bordadeiros de histórias e de nosso sofisticado sexto sentido para fazer passar, ainda que teimosamente, por entre rochas e musgos e lama e concreto e metal e asfalto, a água que sacia nossa gana por direitos ao mesmo tempo em que cura relações futuras e passadas, criaturas e matriarcas, amigas e comparsas.


Para tanto, preciso eu, a fêmea que vos fala, de cada pequeno nó dessa grande rede que nos retroalimenta, apertado por ti, a fêmea que me lê – não a que no espelho ascende, mas aquela que, dentro de ti, nos vê. Eu preciso das mãos de minha mãe, avós, primas e tias, daquelas das quais só encontro em sonhos e também daquelas cuja existência nem sei saber. Precisamos que essa rede se espalhe e fortaleça, silenciosa e inquebrantável, atravessando espaço e tempo, estrangulando o que nos oprime como se efêmero fosse ao perceber-se sobrepujado pela fecundidade nossa, atada em nossa rede, absorvida pelos lençóis freáticos, reconduzida à luz do sol.


Porque paira sobre tudo o que é feminino algo de misterioso, potente e acolhedor, capaz de subverter a lógica e tranquilizar feridas ao passo em que ateia fogo na escuridão de nós. Porque paira o misterioso, potente e acolhedor feminino sobre tudo aquilo de (r)evolução.

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Texto publicado originalmente na versão impressa do Diário da Região.

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30 nov 21 | UMA CRÔNICA SOBRE ESCRITA

"O cheiro da mercadoria chega antes, atravessado pela maresia.

- Esfirra de frango, palmito, carne, senhora?

Saio de trás dos óculos escuros. Sorrio. Ele compreende. Agradece. Segue ele; segue meu olhar a observar seu mecanismo conformado à recusa, resiliente ao destino.

Quem serão os nós que compõem sua rede de apoio? Quem assa a massa? Quem conta o níquel? Quem beija seus olhos antes de cair no sono prometendo que tudo vai ficar bem?"

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➡️ A escrita é um processo que demanda múltiplas habilidades humanas.

A crônica miúda acima esboçada é reflexo disso: não senti o perfume das guloseimas antes de ser pega em sobressalto pela presença do ambulante; não eram esfirras, e sim empadas.

🔎 Os fatos estão ali, e reconhecer o gênero textual por meio do qual os manipulamos nos oferece liberdade para extrapolar às técnica de redação sem enganar a leitora e o leitor.

⚠️ Entretanto, ainda que se mire a escrita de um texto mais sóbrio, como artigos de opinião e dissertações-argumentativas, é preciso treinar o olhar para reconhecer as sutilezas dos contextos associadas aos conceitos a fim de poder salpicá-los da sua autoria.

➡️ A linha que separa o nosso melhor texto dos textos padrões que vez ou outra estamos passíveis de escrever é a mesma que separa nossas emoções, nossa humanidade, da habilidade (treinada) de vertê-las em palavras.

Pois a escrita é essencialmente humana. ✅

Mas não é natural.❎

Por isso, é preciso treiná-la.❗

Começando pelo... olhar - o olhar que percebe, reflete, questiona e se perturba de tal modo que a única escapatória é ESCREVER.

👀 Ao dispensarmos o olhar que JULGA para dar lugar ao que PERCEBE, temos com os dedos enforcados pela linha a ponto de rebentá-la.

🔻 Estude a técnica, e terá uma tesoura em mãos.

🔻 Mergulhe nas figuras de linguagem e será capaz de reconhecer e construir camadas textuais mais profundas.

🔻 Escreva SEMPRE QUE TIVER OPORTUNIDADE e o ofício humano da escrita estará sempre um bocadinho mais acessível a você.
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✔ Então bora apontar o lápis, esquentar os dedos e testar as canetas para um 2022 cheio de textão da p*$$@ pra nós!
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#redação #escrita #texto #sutilezas #olhar #vestibular #Enem #escreva

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29 nov 21 | GUIDA ASTROLOGICA X CUORI INFRANTI

Entre as razões pelas quais indico a série "Guida astrologica x cuori infranti" (Guia astrológico para corações partidos 💔) é a quantidade de expressões com as quais nos deparamos.

💬 Comecei a vê-la por indicação da @celifacile, que nos lembra das lindas paisagens de Torino, uma vez que a série é ambientada lá.

Mas para além dessa razão - que, pelo menos para mim, já seria o suficiente - tem a abordagem leve e divertida sobre enfrentamentos diários da vida de uma mulher FODA que está sempre puxando a culpa para si, acreditando-se não ser merecedora do seu sucesso e que precisa de uma ajudinha externa para reconhecer toda sua potência. 🔥

É essa a mensagem da expressão "Fai vedere al mondo di che pasta sei fatta": mostre ao mundo do que você é feita, mulher! 😉

Uma outra observação interessante é o fato de Alice (nossa protagonista, interpretada por @claudiagusmano) achar que está se autoboicotando toda vez que começa a se relacionar com um homem aparentemente perfeito quando na verdade o cara simplesmente não é tudo aquilo. 🤡

Não é verdade que o mundo está cheio Alices que se conformam com relacionamentos meia-boca só por que ainda não descobriram o mulherão da porra que existe dentro de si? 👀

O que dizer pra essa amiga? 👇🏼

FAI VEDERE AL MONDO DI CHE PASTA SEI FATTA!

Em PT-BR: bota a cara no sol, mona! 😎

P.S.: se você gosta de conhecer novos artistas e estilos musicais, também vai se apaixonar pela trilha sonora dessa série! 🎶

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#guidaastrologicaxcuoriinfranti #serieitaliana #dicamarota #feminismo #feminino #mulheres #expressãoidiomática #linguística

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23 nov 21 | INVISIBILIDADE E CIDADANIA

Evidentemente, entretanto, todo ser socialmente letrado tem plena consciência de que o acesso à cidadania não é democratizado, tampouco garantido a todos de forma igualitária e justa.


É nesse ambiente de reflexão que o tema de redação do Enem 2021, aplicado no último domingo (21), instiga candidatas e candidatos a apontar caminhos de enfrentamento a um problema aparentemente específico e isolado – o fato de quase 3 milhões de brasileiras e brasileiros não serem oficialmente registrados como cidadãos no território nacional. Pode até parecer pouco diante de uma população geral de mais de 200 milhões, mas seria o mesmo que apagar São José do Rio Preto e todas as cidades que compõem a nossa “região metropolitana” do mapa. Você, eu, nossos familiares e amigos simplesmente seríamos invisíveis aos olhos da civilização.


Mas em que implica essa invisibilidade? Este é justamente o ponto delicado tocado pelo recorte temático tratado. Basicamente, nada se faz sem um documento que comprove nossa existência; e embora ele nos lembre que somos mais um número, são estes algarismos que nos garantem o mínimo de acesso à civilidade: matrícula em creches e escolas, atendimento em hospitais, acesso a benefícios governamentais, participação em eventos culturais, emissão de outros documentos tais quais carteira de habilitação (e, com ela, o direito de ir e vir), carteira de trabalho, enfim… desde a necessidade mais básica de sobrevivência até a ocupação dos nossos espaços prescinde-se o registro civil. Sem ele, somos invisíveis.


Apesar de uma premissa tão básica de convivência em sociedade, foi só em 1997 que passamos a ter assegurado o direito ao registro civil de forma gratuita. Ainda assim, grupos minoritários como indígenas, quilombolas e moradores de rua enfrentam desde obstáculos físicos para chegar até os cartórios em que sua identificação seja reconhecida, quanto os cognitivos, quando nos lembramos de que, a depender do contexto cultural do ser vivente, ele dificilmente compreende a importância de registrar a si e a seus filhos.


Pensar essa realidade, ainda que nos pareça distante, é fundamental para a manutenção dos direitos de todos os cidadãos, uma vez que bastam governantes autoritários, preconceituosos, ignorantes e misóginos ascenderem ao poder para que tudo o que foi conquistado ao longo de séculos seja posto à prova. Por isso, não cabe apenas aos estudantes submetidos ao Exame Nacional do Ensino Médio refletirem sobre essa situação problemática, todos nós precisamos exercer nossa cidadania levantando o assunto para debate e nos lembrando da importância de se ter instituições públicas fortalecidas (tais como cartórios, defensoria pública, ministérios e secretarias), pois só elas estão – ou deveriam estar – verdadeiramente comprometidas com o bem-estar de todo e qualquer indivíduo, mesmo aquele que, a nossos olhos, nos seja invisível.

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Texto publicado originalmente na versão impressa do Diário da Região.

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21 nov 21 | REDAÇÃO ENEM

Tirei esta foto minutos antes de saber o tema da redação do Enem 2021: garantia de acesso à cidadania no Brasil:

É preciso ainda interpretarmos os textos de apoio para compreendermos de que forma essa reflexão é atravessada pelo direito ao registro civil entendendo a invisibilidade dos cidadãos brasileiros que não têm esse direito garantido reforço às desigualdades sociais, raciais e financeiras no nosso país.

Mas como a escrita depende do exercício constante do pensamento crítico por meio das leituras cotidianas, como você associaria as mensagens (verbal e não verbal) dessa imagem ao tema caso ela estivesse entre os textos motivadores?

"Que o céu desça até a terra através das batidas do teu coração".

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#redação #Enem #redaçãoEnem #pensamentocrítico #temaEnem #temaredação #reflexão #cidadania #desigualdade #democratização #sociedade

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5 nov 21 | MARIGHELLA

Apesar de ter sido lançado em 2019 (EUA), a produção dirigida por Wagner Moura chega às telas do cinema brasileiro no último dia 4 de novembro, aniversário do assassinato brutal do guerrilheiro Carlos Marighella, brilhantemente interpretado por Seu Jorge, que deu a vida na luta contra a ditadura, abrindo caminhos para que direitos como a liberdade de imprensa fossem conquistados.

O filme estreia em um cenário extremamente sensível, cujos censuradores e torturadores buscam novos caminhos para exercer sua sanha por poder à custa de discursos nacionalistas de segurança nacional, estratégias populistas, desmonte da cultura (a Ancine, por exemplo, órgão de fomento à produção cinematográfica brasileira, foi extinta pelo atual governo) e desgaste de relações internacionais.

Vamos às razões para assistir:

Vamos refletir? Bora debater?

Assista e depois me chame pra gente conversar.

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#cinemanacional #Marighella #cinema #históriadoBrasil #ditaduramilitar #ditaduranoBrasil #redação #pensamentocrítico #interpretaçãodetexto #abaixoaopressão

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26 out 21 | PAINEL DE IDEIAS

Talvez tenha sido influência das figuras de linguagem que estava abordando no conteúdo das aulas ou simplesmente minha imaginação fértil, mas, instantaneamente, construiu-se sob meu consciente a cena de uma das paredes do nosso estúdio vindo abaixo enquanto avançavam em nossa direção zumbis vestindo as feições de nossos conhecidos, familiares e colegas como máscaras.


Ainda estávamos em 2019, o primeiro ano deste governo autocentrado que vivemos atualmente, esse mesmo preocupado com a manutenção de seus próprios privilégios e muito – muitíssimo – determinado em manter-se no poder – custe o que custar. Gabriel e eu, entretanto, mal podíamos imaginar o quão piores se tornariam as condições de vida do brasileiro miserável – aquele que, muito provavelmente, você que me lê duvida da existência por não vê-lo circular no seu bairro.


Tateávamos, então, aquele cenário sombrio de descobertas indigestas, buscando acolhimento naqueles poucos desgraçados que eram capazes de apontar os focos de incêndio que representavam as recentes eleições ao mesmo tempo em que nos descobríamos cercados por pessoas cujo caráter não se sabia mais definir: o limiar entre ingenuidade e estupidez não nos era mais palpável como a quarta parede nos fazia acreditar.


Essa tal parede, me explicou Gabriel, seria uma terminologia usada no teatro para representar a “parede invisível” que separa o público do palco. Sua analogia era referência à falsa sensação que sustentávamos desde o Ensino Médio de que atrocidades estudadas nas aulas de História – tais como ditadura militar e Holocausto – jamais poderiam se repetir, uma vez que estávamos assistindo aos acontecimentos passados do conforto de nossas poltronas, confiantes de que jamais líder político algum admitiria tamanho retrocesso... protegidos, enfim, pela quarta parede.


Meu amigo tinha razão. Caíra a quarta parede, levando consigo muito das nossas esperanças juvenis sem que tivéssemos tempo suficiente para assimilar os estragos. É claro que o amargor que amarra a boca do estômago ao ver pessoas queridas endossando os discursos idiotizados da criatura eleita, bem como os de seus herdeiros, é dolorido; mas, hoje, já no rumo das próximas eleições presidenciais, com uma conta estourada em óbitos, uma lista sem fim de agrotóxicos liberados para consumo da população que são proibidos nos Estados Unidos e na Europa, com um ministro da Economia envolvido em escândalo fiscal que se beneficia da alta do dólar para encher ainda mais os fundilhos de dinheiro fazendo “do coração, tripas” para que o teto de gastos federal dê conta de uma mirabolante obra populista e oportunista do novo Bolsa Família, é mais do que dor o que sentimos – é, sim, um refogado de desgosto e medo servido ao molho de laranjas envenenadas que nos mata paulatinamente.


É, Gabriel, seguimos. Seguimos recolhendo os cacos que sobraram das nossas ilusões rompidas pelo grito desesperado dos vermes que jaziam escondidos sob o mofo da elite. Quem sabe, no ano que vem, possamos colar-nos os pedaços em um mosaico colorido e retumbante, gigante pela própria natureza de ser regido por líderes que amem pessoas e usem verbas, em vez do contrário.

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Texto publicado originalmente na versão impressa do Diário da Região.

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